FMLGBT emite nota de repúdio a declaração do Presidente do PPS de Mogi


Após a declaração do presidente do diretório municipal do Partido Popular Socialista em Mogi, Dr. Delmiro Goveia, publicado aqui neste blog, o Fórum Mogiano LGBT emitiu uma nota de repúdio e pede retratação pública, providências ao partido e remoção do conteúdo, que após as reclamações foram já excluídas por Goveia. Confira a nota, e opinião do Dr. Paulo Iotti:


NOTA DE REPÚDIO A DECLARAÇÃO DO PRESIDENTE DO DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS) EM MOGI DAS CRUZES/SP


Considerando que é fundamento do Estado Democrático de Direito, conforme Artigo 1º da Constituição Federal, a cidadania e a dignidade da pessoa humana;

Considerando que é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, conforme Artigo 3º da Constituição Federal, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;

Considerando o julgamento da ADI 4277/DF pelo Supremo Tribunal Federal que declarou o reconhecimento da união de pessoas do mesmo sexo como entidade familiar;

Considerando a Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013 do Conselho Nacional de Justiça que veda a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo;

Considerando as reconhecidas ações e posições do Partido Popular Socialista em âmbito nacional a favor da cidadania e direitos humanos para a população LGBT;

O Fórum Mogiano LGBT, associação sem fins lucrativos e apartidário composto por lésbicas, gays, bissexuais, trans e pessoas aliadas ao enfrentamento da homofobia e da transfobia no município de Mogi das Cruzes, vem a público manifestar repúdio ao senhor presidente do diretório municipal do Partido Popular Socialista e advogado Dr. Delmiro Goveia, pela declaração publicada na data de 01 de Janeiro de 2014 em seu perfil na rede social Facebook, onde diz: “Casal para mim é de homem e mulher. O resto é sacanagem”.

Entendemos que tal declaração, promove a discriminação e o preconceito contra a população LGBT, atualmente vulnerável a discriminações e violências em razão das suas orientações sexuais e identidades de gênero, consideramos também como ofensiva às famílias homoafetivas e diante desse posicionamento homofóbico e heterosexista exigimos a retratação pública do autor, providências do Partido Popular Socialista e a remoção imediata da publicação, mesmo com suas edições.

Não é a primeira vez que o presidente do PPS de Mogi das Cruzes, Delmiro Goveia, faz declaração homofóbica, em 2002 em processo judicial pedindo a cassação de uma vereadora supôs que a sua orientação sexual é homossexual e mencionou de modo depreciativo, como se fosse algo incompatível com sua função, com a seguinte frase: “Especialmente para requerer Pedido de Cassação da Vereadora (...) da Câmara Municipal de Mogi das Cruzes, conhecida pelo apelido de “ovo com Perna” e adepta do Lesbianismo, por falta de decoro em sua conduta pública e proceder de modo incompatível com a dignidade da Câmara Municipal de Mogi das Cruzes(...)”.

Externamos a nossa preocupação em construir uma sociedade mogiana que respeite a diversidade sexual, pois uma sociedade sem preconceitos contra a população LGBT é mais justa, fraterna e igualitária.


Comissão Executiva do Fórum Mogiano LGBT: Roberto Fukumaro, Regina Tavares, Gustavo Don, Silmara Encarnação, Fernando Petersen, Carmela Vilardo, Alexandra Braga, Alex Schiszler e Décio Ribeiro.


OPINIÃO DO ADVOGADO DR. PAULO IOTTI

“Liberdade de expressão não garante direito a ofensas e você, Sr. Delmiro Goveia, ao dizer que todo casal que não fosse formado por "homem e mulher" seria "sacanagem" (sic) evidentemente ofendeu toda a comunidade homossexual, por ter ofendido casais homoafetivos em geral (é indefensável dizer que acusar algo de "sacanagem" no contexto que você usou não teria sentido ofensivo, espero que não desafie a inteligência dizendo algo assim...). Há não muitas décadas, ofensas similares eram perpetradas contra "casais inter-raciais" - se hoje alguém dissesse que "casal para mim é entre brancos, o resto é pura sacanagem", ninguém teria dúvidas de que isso é crime de racismo; em sentido similar, ultrapassa os limites da liberdade de expressão ofender casais homoafetivos da forma como você (inegavelmente/incontestavelmente) ofendeu; pode até (ainda) não ser crime a "injúria coletiva" contra LGBTs sem lei que o preveja (embora a Procuradoria-Geral da República esteja defendendo o contrário em Inquérito que aguarda julgamento perante o Supremo Tribunal Federal), mas não há dúvida que a sua fala se enquadra como "ilícito civil", como dano moral coletivo e evidente violação do estatuto que veda discriminações por orientação sexual e identidade de gênero. Independente do que diga a lei, é igualmente absurdo menosprezar alguém por sua orientação sexual/identidade de gênero ou sua cor, religião, etnia ou procedência nacional, para ficar só nestes exemplos. Logo, absolutamente lamentável sua fala aqui criticada. Enfim, posições como a sua mostram que estou certo quando falo que a liberdade de expressão é outro lamentável mal entendido nesse país - e, de qualquer forma, se você expõe publicamente sua opinião, as pessoas têm a liberdade de expressão de criticar a sua opinião. No popular, quem fala o que quer, ouve o que não quer..."

Paulo Roberto Iotti Vecchiatti
Mestre e Doutorando em Direito Constitucional pela Instituição Toledo de Ensino/Bauru
Especialista em Direito Constitucional pela PUC/SP
Especialista em Direito da Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo
Advogado - OAB/SP 242.668
Autor do Livro "Manual da Homoafetividade. Da Possibilidade Jurídica do Casamento Civil, da União Estável e da Adoção por Casais Homoafetivos" (2ª Edição, São Paulo: Ed. Método, 2013)
Co-autor dos Livros "Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo" (organizado por Maria Berenice Dias), "Minorias Sexuais. Direitos e Preconceitos" (organizado por Tereza Rodrigues Vieira), "Manual do Direito Homoafetivo" e "Manual dos Direitos da Mulher" (ambos coordenados por Carolina Valença Ferraz, George Salomão Leite e Glauco Salomão Leite)
Membro do GADvS - Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual

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